Pages

quarta-feira, 13 de agosto de 2014

Como harmonizar a ambição da prosperidade com as advertências bíblicas quanto aos perigos da riqueza?

Alguns foram torturados, [...] apedrejados, provados, serrados pelo meio, mortos a f de espada; andaram peregrinos, vestidos de peles de ovelhas e de cabras, necessitados, afligidos, maltratados [...], errantes pelos desertos, pelos montes, pelas covas, pelos antros da Terra. Hebreus 11:35-38

Milhões de pessoas foram seduzidas pela pregação de uma heresia recente conhecida como “teologia da prosperidade”. A convicção central do movimento da prosperidade é a ideia de que é plano de Deus que os cristãos, sempre e em cada caso, tenham saúde física, riqueza e sucesso material. Assim, o alvo da vida cristã seria atingir ilimitado bem-estar materialista. Vemos nisso uma radical mudança de ênfase: da providência centralizada em Deus, tradicionalmente afirmada pelo cristianismo, para a prosperidade centralizada no ser humano. A implicação é desastrosa para cristãos pobres e enfermos. Por falta de fé ou por não estarem utilizando as fórmulas corretas para “torcer” o braço de Deus, eles estariam fora do ideal divino.

Neste “evangelho”, Deus é reduzido a um tipo de “gênio da lâmpada” a serviço dos caprichos humanos. Ele e Seu Universo giram ao redor do conforto pessoal. Isso dá a esses pretensos cristãos a “liberdade” de se aproximarem dEle com a imposição de suas fantasias de sucesso e prosperidade, como se realização materialista fosse a marca de verdadeira espiritualidade, e a solução final de todos os problemas do homem. Tudo o que se precisa é “balançar” o dedo atrevido na face de Deus e “reclamar” aquilo que foi “visualizado”, falar “palavras de fé” ou “dar testemunho positivo” para que automaticamente alcancem aquilo que supostamente lhes foi prometido.
O neopaganismo da prosperidade, com base na ignorância da Palavra de Deus, não passa de uma teoria herética, uma versão piorada do hedonismo e materialismo do capitalismo ocidental. O texto de hoje fala de pessoas que não se ajustam às noções fantásticas da prosperidade aqui e agora. A vida delas, com enormes dificuldades, mas em submissão a Deus, envergonha o superficialismo da religiosidade de milhões em busca de “pão e circo”. Ser um discípulo de Cristo não significa que não teremos dias ruins. Significa apenas que, em meio às perplexidades e aos desencantos, podemos olhar além e ver que Deus é bom. O que de fato nunca falha é Sua graça, mesmo em nossos vales de sombras e tribulações.

Procura apresentar-te a Deus aprovado, como obreiro que não tem de que se envergonhar, que maneja bem a palavra da verdade. 2 Timóteo 2:15

Uma das razões para o êxito da teologia da prosperidade é o desconhecimento das Escrituras. Tanto pregadores quanto suas audiências ignoram os rudimentos da interpretação bíblica. Tais pregadores falam aquilo que as pessoas querem ouvir. A mensagem deles é atrativa para a cultura materialista: casa melhor, no lado certo da cidade; carro novo; negócios lucrativos; roupas de grife; férias exóticas. Basta ouvir os “testemunhos” para ficarmos alarmados. E tudo isso “canonizado” com o uso perverso de textos bíblicos forçados para se ajustar a uma pressuposição completamente estranha à Palavra de Deus. Cria-se assim o ambiente para que a ênfase pragmática e materialista da cultura acabe triunfando. Prova-se então a verdade de que, se a religião não nos transforma, nós a transformaremos para que ela se adapte às nossas opiniões e simpatias.

No texto de hoje, Paulo recomenda o uso apropriado da Palavra. O termo grego traduzido por “manejar” significa “cortar em linha reta”. Isso nos sugere responsabilidade no uso das Escrituras. O pecado mortal dos falsos mestres é o abuso da Palavra de Deus (2Co 2:17). Esse abuso é traduzido como “mercadejar” ou “adulterar”. Devemos lembrar, contudo, que o correto conhecimento da Palavra de Deus não se limita aos ministros. Se as audiências da “prosperidade” tivessem pelo menos uma perspectiva bíblica da vida, não seriam ludibriadas por mensagens tão espúrias.

Pode-se confiar no discurso dos pregoeiros da prosperidade? A mensagem deles não passa em um simples teste bíblico. Promete Deus saúde e cura em qualquer circunstância? Paulo não foi capaz de curar alguns de seus associados: Epafrodito (Fp 2:27), Timóteo (1Tm 5:23) e Trófimo (2Tm 4:20).

Ele mesmo sofreu de uma enfermidade física (Gl 4:13-15). Três vezes orou por libertação, sem receber cura (2Co 12:8-10). Além disso, seria a pobreza sinal de maldição, como alegado pela heresia da prosperidade? Paulo declarou-se pobre, sem nada possuir (2Co 6:10). E Jesus, que não teve onde reclinar a cabeça (Mt 8:20)? Será que eles também não tinham fé? Como harmonizar a ambição da prosperidade com as advertências bíblicas quanto aos perigos da riqueza (Mt 5:24; Lc 12:33, 34; Hb 13:5; Cl 3:5)?


Pr. Amin Rodor