Cada um dos autores dos evangelhos procurou dar a sua
própria versão da Grande Comissão Evangélica. Lucas inclusive dá uma segunda
versão em Atos[1].
De um modo geral, com base nesses textos podemos dizer que há três elementos
que são indispensáveis ao cumprimento da missão: Proclamação (Kerigma),
Discipulado (Mathetéusate) e no contexto da volta de Jesus (Parusia).
Para que nossa mensagem seja completa, ela deve não
apenas proclamar, mas ser intencionalmente direcionada a formar discípulos e
apontando para o breve retorno de Cristo. Aliás, a chama que sempre nos moveu
como igreja é o assunto da Parusia, isto tem que ver com a nossa própria
identidade.
Porém, pensando bem, até aqui não há
nada que nos diferencia dos cristãos em geral no que respeita á missão, pois,
todos também crêem no dever de proclamar o Evangelho, fazer discípulos e na
volta de Cristo. Como povo remanescente da Profecia
Bíblica[2],
os Adventistas do Sétimo Dia têm uma responsabilidade específica e distintiva
dada por Deus em relação ao cumprimento da missão. Isto se torna evidente
quando analisamos as três mensagens angélicas (Apoc. 14:6-12).
A
compreensão e a proclamação da mensagem dos três anjos de Apocalipse 14 é fundamental
para a nossa identidade profética. Essa passagem se tornou o coração do
Adventismo, a ponto de até usarmos uma figura desses três anjos como a
logomarca da nossa igreja. Esta mensagem não é aceita e pregada por nenhuma
outra denominação cristã, pois, Deus deu á Igreja Adventista do Sétimo Dia o
privilegio de entendê-la e o dever de anunciá-la. Nas três mensagens angélicas
encontramos os três elementos que devem compor a nossa missão:
1.
A
proclamação: “Vi outro anjo voando pelo meio do céu,
tendo um evangelho eterno para proclamar aos que habitam na terra, a toda
nação, tribo língua e povo”. Apoc 14:6
Este
anjo simboliza o povo de Deus[3], e “o vôo do anjo pelo
meio do céu, a grande voz com que é proferida a grande advertência... evidenciam
a rapidez e extensão mundial do movimento” [4].
O
evangelho eterno é, portanto, proclamado a todo o mundo. Como vimos, o elemento
proclamação (kerigma) está presente na mensagem dos três anjos.
2.
Discipulado:
A mensagem dos três anjos também enfoca o discipulado, pois, no verso 12 diz
“aqui está à perseverança dos santos, os que guardam os mandamentos de Deus e a
fé de Jesus”.
Como resultado da
proclamação do evangelho eterno, surge um povo perseverante e obediente,
verdadeiros discípulos. Portanto, o elemento discipulado está presente na
mensagem dos três anjos.
3. Volta de Jesus: A
mensagem dos três anjos prepara um povo para a volta de Jesus. No verso 7 diz
que chegou a hora do juízo. Isto é uma referência ao juízo celestial, cuja
primeira fase se iniciou em 1.844 (Daniel 8:14). Quando terminar esta primeira
faze do juízo, chamada de “investigação”, Cristo deixa o santuário celestial e
vem para buscar os salvos. Portanto, a mensagem dos três anjos aponta para a
volta de Jesus.
Diante
disto, Russell Burrill afirma que Apocalipse 14 deve ser visto como um
comentário de João sobre a grande comissão, dando-lhe uma aplicação para os
últimos dias da história da humanidade[5]. Isto
se torna ainda mais claro quando outros aspectos são analisados.
Os
cento e quarenta e quatro mil selados (Apoc. 14:1-5)
A
descrição dos cento e quarenta e quatro mil aparece logo antes da mensagem dos
três anjos. Na compreensão adventista este é um número simbólico, que
representa aqueles que estarão vivos e preparados por ocasião da segunda Vinda
de Cristo[6].
Como
resultado da pregação da mensagem dos três anjos, surge um povo preparado para
receber Jesus por ocasião de sua segunda vinda, são verdadeiros discípulos. Assim,
há uma conexão entre os cento e quarenta e quatro mil e os “santos,
perseverantes e obedientes” do verso 12.
Outro
detalhe que reforça esta idéia surge quando comparamos as características dos discípulos
descritos por Jesus e as características dos cento e quarenta e quatro mil.
Percebe-se que as características são idênticas, levando á lógica conclusão de
que os cento e quarenta e quatro mil representam os verdadeiros discípulos dos
últimos dias. Vamos ás características:
1.
O Discípulo se parece com o mestre (Mat.
10:24 e 25).
Esta mesma
característica se vê nos cento e quarenta e quatro mil, que “tem o nome de
Cristo e do Pai escrito na testa” (Apoc. 14:1). Ter o nome de Deus na fronte é
uma maneira de dizer que eles trazem na face a imagem de Deus, que deve ser o
alvo de todo cristão. Em outras palavras, eles são semelhantes a Deus. O grande
alvo de Cristo é restaurar no homem a imagem de Deus, preparando-o para o céu[7].
2. O
Discípulo renuncia a tudo por causa do evangelho (Luc. 14:26, 27 e 33). Falando
dos cento e quarenta e quatro mil diz o texto que eles foram “comprados pelo
sangue do cordeiro”, pois renunciaram a tudo por Cristo. São comprados pelo
sangue do cordeiro em face de terem colocado Cristo em primeiro lugar e por
renunciarem o que for necessário pelo evangelho; são características
semelhantes.
3. O
Discípulo permanece nas palavras de Cristo. (Jo 8:31 e 32).
Da mesma forma os cento e quarenta e
quatro mil possuem uma fé genuína, não contaminada com o vinho de Babilônia
(Apoc. 14:4). Os verdadeiros discípulos nos últimos dias se mostram fiéis á palavra de
Deus, mesmo em meio a tanta confusão religiosa.
4. O
Discípulo é conhecido pelo amor (Jo 13:34 e 35)
Os cento e quarenta e quatro mil “seguem
o Cordeiro por onde quer que vá” (Apoc. 14:7). Seguem o Cordeiro porque amam de
todo coração. Inclusive seguem os passos do cordeiro em servir ás pessoas,
mostrando que também amam as pessoas que necessitam da salvação. Aqui
encontramos o elemento missão envolvendo o discipulado. Pois, por amor o
discípulo segue a Cristo e busca salvar os que perecem no pecado.
5. O
Discípulo produz muito fruto (Jo 15:8)
Fruto aqui se refere primeiramente à transformação
do caráter. Por isto, produzem o “Fruto do Espírito” (Gál. 5:22). Da mesma forma os cento e quarenta e quatro
mil são descritos como “imaculados, em quem não foi achada nenhuma mentira”
(Apoc 14:5). A característica é semelhante. Podemos dizer que também o fruto se
aplica à salvação de outras pessoas, ou à reprodução de outros discípulos.
Porém,
talvez o elemento mais convincente da importância das três mensagens angélicas
para o cumprimento da missão adventista, seja o fato de que encontramos nelas
princípios doutrinários essenciais para a formação dos verdadeiros discípulos
nos últimos dias. Muitas das doutrinas explícita e implicitamente ali expostas
ou são ignoradas ou rejeitadas pelo cristianismo em geral, e como conjunto,
somente os adventistas as ensinam. Daí a responsabilidade que temos como Igreja
Remanescente.
A
primeira é o “Evangelho Eterno”, descrito na mensagem do primeiro anjo (Apoc. 14:6).
“A linguagem usada aqui é semelhante
àquela usada na grande comissão. Isto indicaria que as três mensagens angélicas
são uma ampliação daquela comissão, na forma em que deve ser cumprida nos
últimos dias”.[8]
O
mesmo Evangelho proclamado no início da igreja cristã também deve ser pregado
nos dias finais da história humana. Isto porque não há outro meio de alcançar a
salvação, senão, pela justiça de Cristo. É a mensagem da justificação pela fé,
as boas novas de que pelos méritos de Cristo, conquistados na cruz, há perdão e
salvação.
O
primeiro passo para a formação de um discípulo é levá-lo ao encontro com Cristo,
através da mensagem da cruz, o Evangelho Eterno. Em segundo lugar vem o seu
compromisso de discipulado que envolve a restauração da imagem de Deus. A
salvação é somente pela graça e ponto final (Rom. 3:21-24), o discipulado
aparece como resultado e não como causa da salvação, e envolve a restauração da
imagem de Deus no homem, preparando-o para o Céu. É neste contexto que as
doutrinas são importantes. E nestes dias finais, quando muitas das doutrinas
bíblicas estão sendo ignoradas e jogadas por terra, o movimento adventista
recebeu de Deus a incumbência de restaurá-las e de proclamá-las. Necessitamos
delas para a formação dos verdadeiros discípulos para a volta de Jesus.
1. Os
princípios de saúde: A primeira mensagem angélica conclama o povo a glorificar
a Deus (Apoc. 14:7). Paulo diz que glorificamos a Deus através de nosso corpo (I Cor.6:19-20). Isto significa que quando o
caráter de Cristo se reflete através da nossa vida, estamos glorificando a Ele.
Portanto, os princípios de saúde, os remédios da natureza, a temperança que
implica no uso moderado do que é bom e na abstinência do que é impróprio devem
fazer parte de nossa experiência de vida e de nossa pregação, pois são
elementos determinantes para a nossa comunicação dom Deus e consequentemente
para a transformação de nossa vida.
2. A
Doutrina do Santuário: quando João fala do juízo na mensagem do primeiro anjo,
ele está se referindo ao ministério de Jesus no santuário celestial como
intercessor e, desde 1844, como juiz. A obra de Jesus no santuário celestial é
tão importante para o plano da salvação como sua morte na cruz.
3. O
Sábado e a lei de Deus. Na mesma mensagem do primeiro anjo o povo é instado a
adorar a Deus como O Criador, uma referência clara à mensagem do sábado,
memorial da criação (Êxo 20:6-11) e, consequentemente á lei de Deus. O sábado como
um dia de adoração a Deus, serviço ao próximo e convívio familiar é essencial
para a transformação de nosso caráter para o céu.[9]
4. A
mensagem do segundo anjo adverte contra “o vinho de Babilônia”, uma referência
às falsas doutrinas pregadas por ela, incluindo a imortalidade da alma, a
justificação pelas obras e o falso dia de guarda. É nossa responsabilidade
mostrar a correta visão bíblica sobre esses assuntos.[10]
Como
disse Russell, “a compreensão básica adventista das verdades bíblicas
centralizadas nas três mensagens angélicas de Apocalipse 14 prepara pessoas
para o verdadeiro discipulado.” [11]
Mantenhamos
clara a visão de que o alvo de nossa missão é o discipulado e a base de nossa
missão as mensagens angélicas. Dar a mensagem
não é o alvo da nossa missão – o foco da nossa missão é fazer discípulos que
estejam prontos para encontrar Jesus quando Ele vier.
Pr. Jolivê Chaves
Diretor SALT/IAENE
[1]
Veja Mat. 8:14; 28:18-20; Marc. 16:15 e 16; Luc. 24:46 e 47. Jo 20:20 e Atos
1:8
[2]
Com base em textos como Daniel 8:14; Apoc. 10 cremos que somos um movimento
profético, levantado por Deus como reparadores de brechas (Isaías 58:12 e 13).
Somos, por tanto, responsáveis por pregar verdades que foram esquecidas pelo
meio cristão.
[3]
“Esta é uma visão simbólica. O anjo representa os santos de Deus empenhados na
tarefa de proclamar o evangelho eterno”. DAS bible comentary, vol. 7, pág 827.
[4]
Ellen G. White, o Grande Conflito, pág. 355
[5]
Russell Burrill, Discípulos Modernos. (Tatuí,
SP: Casa Publicadora Brasileira, 2006), 75.
[6]
Idem, 77
[7]
Ellen White diz: “Cristo aguarda com fremente desejo a manifestação de Si mesmo
em Sua igreja. Quando o caráter e Cristo se reproduzir perfeitamente em Seu
povo, então virá para reclamá-los como Seus”. Eventos Finais, pag. 39.
[8]
Russell Burrill, pags, 84 e 85.
[9]
Ellen White diz “o sábado não deve ser gasto em ociosidade... Ele nos ordena
colocar de lado nossas ocupações diárias e devotar a essas horas sagradas um
repouso saudável, para adoração e para boas obras”. Vida de Jesus, 74
[10] “Mediante
os dois grandes erros - a imortalidade da alma e a santidade do domingo -
Satanás há de enredar o povo em suas malhas. Enquanto o primeiro lança o
fundamento do espiritismo, o último cria um laço de simpatia com Roma”. Ellen
White, Maranata, o Senhor Vem, MM, 1977 pag. 185.
[11]
Russell Burrill, pag.96